José Carlos Bumlai, empresário amigo do ex-presidente, é um dos focos da apuração sobre suposto esquema de propina envolvendo empresa de água e esgoto; interceptação telefônica revelou intenção do pecuarista de negociar delação premiada e proteger petista
Relatório de 408 páginas sobre suposto esquema de corrupção e mensalinho na Prefeitura de Campinas (SP) agita o PT. O documento feito por quatro promotores do Gaeco, núcleo do Ministério Público que combate o crime organizado, sustenta ordem judicial de prisão contra 20 suspeitos - entre eles o vice-prefeito Demétrio Vilagra (PT), foragido desde sexta feira -, e cita como alvo da investigação o pecuarista e empresário José Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), de quem é anfitrião em momentos de lazer.
Apontado como elo da empreiteira Constran com diretores da Sociedade de Abastecimento de Água e Saneamento S/A (Sanasa), empresa responsável pelo planejamento, execução e operação dos serviços de água e esgoto da cidade, Bumlai teria admitido a possibilidade de fazer delação premiada para "proteger Lula". O advogado de Bumlai, Mário Sérgio Duarte Garcia, nega taxativamente ligação do empresário com propinas em Campinas. "É uma acusação criminosa."
Lula é próximo também do prefeito Hélio de Oliveira Santos, o Dr. Hélio (PDT), seu aliado nas campanhas de 2002 e 2006 e apoiador de Dilma Rousseff em 2010. A mulher do prefeito, Rosely Nassim, está na mira da promotoria. A investigação a coloca no topo da suposta organização criminosa. A primeira-dama, chefe de gabinete do marido, não foi presa porque um habeas corpus a livrou liminarmente de "medida coercitiva".
O nome de Bumlai é mencionado na interceptação telefônica de um diálogo entre um advogado e Luiz Augusto Castrillon de Aquino, ex-diretor-presidente da Sanasa, foco do desvio de verba em Campinas, segundo a promotoria. À página 271, o relatório destaca que, em 26 de abril, Aquino conversa com o advogado após reunião com um homem chamado de Ítalo Barione.
"De acordo com Luiz Aquino, Ítalo Barione estaria colhendo informações, a pedido do próprio José Carlos Bumlai, para viabilizar a formalização, junto ao Ministério Público, de delação premiada em favor dele", informa o documento. "Aquino relata que Bumlai teria intenção de proteger Lula." Um resumo da conversa, nos autos da promotoria: "Aquino diz que Bumlai quer fazer acordo e "o que ele puder fazer para proteger Lula, tudo bem"".
Pertinência. Para os promotores, "o teor do diálogo é totalmente pertinente". Eles falam das relações de Bumlai e Lula. "O empresário talvez tivesse a preocupação de não propiciar uma exposição negativa em razão da amizade de ambos."
A delação premiada não ocorreu. Bumlai não depôs no inquérito. Segundo o relatório, "informações apontam que a participação de Bumlai no esquema investigado extrapola a simples representação dos interesses da Constran junto ao grupo de Rosely Nassim e o correlato repasse de porcentuais do contrato mantido com a Sanasa".
"Já há informações no sentido de que Bumlai teria participação ainda mais direta no esquema de corrupção, inclusive com possível ascendência sobre Rosely Nassim", diz o texto. "Resta aferir é se a aventada intenção de Bumlai de formalizar uma delação premiada se deve apenas à sua participação no repasse de porcentuais do contrato da Constran ou se ele ocupa alguma outra função mais específica dentro do esquema criminoso investigado."
Mensalinho. A base da investigação que alvoroça o PT são os depoimentos de Aquino, que presidiu a Sanasa de janeiro de 2005 a julho de 2008. Ele fez delação premiada, em dois extensos depoimentos. Detalhou o mensalinho. Servidores recebiam parcelas fixas na divisão dos porcentuais de propinas. Aquino disse ter sido "coordenador estratégico da campanha de Dr. Hélio em 2004, da qual "Bumlai participou ativamente".
"No início do primeiro mandato, o prefeito nomeou a mulher chefe de gabinete, tendo ela assumido amplos poderes na gestão", disse Aquino. "Rosely decidiu montar esquema de arrecadação financeira clandestina na administração. Ou ingressava no esquema e propiciava a arrecadação ilícita de fundos ou era tirado do cargo que ocupava. Ela controlava praticamente todos os setores da administração."
Segundo Aquino, a primeira-dama "estabelecia metas anuais". "A arrecadação dos valores referentes aos contratos de prestação de serviços ficaria a meu cargo. A arrecadação dos contratos de obras ficaria a cargo de Aurélio Cance Júnior, diretor técnico." Cance Júnior está preso. Aquino citou oito contratos. "Os porcentuais (da propina) variavam de 5% a 7% sobre o valor da obra."quinta-feira, 16 de setembro de 2010
MP no encalço da família Bumlai, amiga de Lula
O procurador Carlos Humberto Prola Junior cobrará dos filhos do pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula, a devolução dos recursos públicos pagos indevidamente a título de desapropriação da Fazenda São Gabriel, em Corumbá (MS). A suspeita do Ministério Público é de que tenha havido superfaturamento no processo de desapropriação da fazenda, comprada pelo Incra em 2005 para assentar trabalhadores rurais.
A pedido do MP, a Justiça Federal suspendeu na sexta-feira o pagamento dos títulos da dívida agrária (TDAs) referentes à desapropriação do imóvel dos Bumlai. O Incra avaliou a propriedade em 20,9 milhões de reais. Desse valor, 4,3 milhões de reais, relativos às benfeitorias, foram pagos à vista e 16,6 milhões de reais, convertidos em TDAs a serem resgatados em até 10 anos.
Para o MP, porém, a fazenda vale 13,3 milhões de reais, 36% a menos do que o Incra se predispôs a pagar. Chegou-se a esse valor após análise de campo de agrônomos do próprio MP e de relatório da Embrapa que constatou uma qualidade inferior da terra ao informado pelo Incra.
Até agora, o instituto gastou 14,2 milhões de reais e iria fazer, não fosse a decisão judicial, um pagamento de TDAs de mais 4 milhões de reais no dia 1º de outubro aos filhos do amigo de Lula. O MP ainda não calculou quanto cobrará dos filhos de José Carlos Bumlai – Maurício, Fernando, Cristiane e Guilherme. Amigão de Lula, o discreto Bumlai quase virou ministro da Agricultura no primeiro mandato do presidente.
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