Pior é não fazer operações, diz coronel sobre morte de menino
17 de julho de 2010 • 22h21 • atualizado às 22h31
Wesley Andrade morreu atingido por uma bala perdida na zona norte do Rio
Foto: Severino Silva/O Dia
Responsável pela operação nas favelas da Quitanda e Pedreira, na capital fluminense, onde o menino Wesley Guilber de Andrade, 11 anos, morreu atingido por tiro dentro da sala de aula de uma escola na manhã de sexta-feira, o coronel Fernando Príncipe lamenta a morte, mas defende a manutenção das ações policiais. "O Ciep Rubens Gomes - onde aconteceu o fato - é irrelevante. Se não houver Ciep, haverá uma casa, uma fábrica. Mas o pior é não realizar operações", disse.
Afastado do comando do 9º BPM, o coronel abre fogo contra o comandante-geral da corporação, coronel Mário Sérgio Duarte. "Com a minha exoneração, o comandante-geral diz para os outros comandantes que eles devem privilegiar a omissão e a covardia, devem privilegiar o não fazer". Príncipe diz que não errou e que a perda de vidas inocentes, "eventualmente, vai acontecer".
Para o coronel, a operação no local era necessária. Ele afirma que empresários da Fazenda Botafogo já haviam o procurado para reclamar da situação no local. "A ação começou às 8h20, havia 100 homens comandados por um major. Tínhamos como alvos a comunidade de Final Feliz e os morros da Pedreira, Lagartixa e Quitanda. O bandido é inconsequente, faz disparos em qualquer direção. Tivemos que trocar tiros. Não há outro jeito de se fazer operação. Ou é assim ou, então, não faz. A inteligência diz que o bandido ele está lá dentro (da favela). Temos que ir lá. O que a polícia deve fazer? Não fazer nada é prevaricação", afirma.
Sobre a morte do menino, o comandante exonerado diz lamentar, porém se isenta da culpa. "Eu lamento muito, claro. Mas não fui responsável por ela, meus policiais também não. Com a minha exoneração, o comando mostra que não assume a responsabilidade de seus comandados. Não foi a primeira vez que um estudante foi atingido naquele Ciep, e o poder público nunca providenciou a blindagem do prédio. Abomino a morte de inocentes, mas isso, eventualmente, vai acontecer."
Enterro
Wesley foi enterrado na manhã de sábado, no cemitério de Irajá. No sepultamento, acompanhado por 70 pessoas, amigos da vítima e professores lembraram a tragédia. A professora do menino, Mariza Helena, foi a primeira a prestar socorro. "Quando ouvimos os primeiros tiros, saímos da sala e nos posicionamos no corredor. Ali era um lugar que considerávamos mais seguro. Mas o tiroteio parou e voltamos para a sala de aula. De repente, ouvimos novos disparos. As crianças começaram a correr para fora, mas uma bala entrou na sala".
Mariza contou que, depois de ser atingido, Wesley ainda correu até o corredor. "Ele caiu no chão do corredor e começou a sangrar. Os coleguinhas gritavam pedindo que não deixasse ele morrer. Tenho 40 anos de magistério, 17 só nesta escola. Mas, depois disso, não sei se conseguirei voltar para a sala de aula", disse.
Diretora da unidade, Rejane Faria passou mal no velório. "Tudo foi embora, todo o nosso trabalho. Me perdoa pai, me perdoa mãe", afirmou. Na segunda-feira, as aulas no Ciep Rubens Gomes estão suspensas. Psicólogos e assistentes sociais da Secretaria Municipal de Educação se reunirão com professores e alunos, que vão vestidos de branco em pedido por paz.
Pai de Wesley, o comerciante Ricardo Freire cobrou a presença de autoridades do Estado na despedida do filho. "Eles não se preocuparam porque os filhos deles andam de carros blindados e passam longe das áreas de risco", disse. O governo estadual arcou com o custo do enterro. "O tudo deles não é nada pra gente."