As linhas que se seguem não fazem o menor sentido no ano da graça de 2010. No presente momento histórico, como se sabe, o presidente da República Federativa do Brasil adquiriu imunidade verbal.
Daqui a uns dez anos – ou serão necessários 50? – valerá a pena refletir sobre o comício feito por Luiz Inácio da Silva no auge de uma das maiores calamidades urbanas já sofridas pelo país por ele governado.
Enquanto autoridades batiam cabeça diante de dezenas de vidas indo embora morro abaixo, em Niterói, no pior dos desdobramentos da tragédia do Rio, Lula ria. Apresentando o slogan “Ela é Dilmais” a uma platéia de puxa-sacos em Brasília, o presidente evoluía num palanque festivo do PCdoB: urrava palavras de ordem eleitorais, disparava mensagens tresloucadas para promover sua candidata.
Num dos momentos de maior excitação, Lula resolveu dar um salto mortal sobre as leis, afrontando a Justiça (que o puniu por propaganda eleitoral fora de hora):
“Não podemos ficar subordinados ao que um juiz diz que podemos ou não fazer”.
É curioso que a vida siga seu curso normal depois de uma frase dessas, dita por quem a disse. Se algum outro brasileiro tivesse a imunidade verbal de Lula, certamente responderia:
“Não podemos ficar subordinados a um presidente que nos convida a esculhambar o estado de direito.”
O lixo retórico de Lula é idêntico ao lixo físico do Morro do Bumba, que foi abaixo soterrando dezenas de casas: são atos de descaso com as regras, com a sociedade, com a vida. Parecem inofensivos. Mas são trágicos.
Ainda bem que o Brasil está anestesiado pelo lulismo.
Seria muito doloroso para essa gente ver o presidente da República, na noite da quinta-feira fatídica, animando festa eleitoreira, ridicularizando as instituições nacionais e fazendo saudações ao “amigo Ahmadinejad” (o tarado atômico do Irã).
Daqui a meio século talvez a anestesia passe, e o Brasil se envergonhe desse palanque à prova de chuva e de dor.