GABRIELA GUERREIRO
da Folha Online, em Brasília
Na carta de renúncia ao governo do Distrito Federal, o governador interino Paulo Octávio (sem partido), afirma que decidiu deixar o cargo por não ter apoio político suficiente para se sustentar no comando de Brasília.
Em cinco páginas, Octávio afirma que sempre teve o "sonho" de governar o DF, mas decidiu abrir mão de suas funções para "apaziguar os ânimos" depois da prisão do governador afastado José Roberto Arruda (sem partido).
A Folha Online teve acesso à carta, na qual o governador interino se diz disposto a "responder por todos os seus atos", uma vez que é acusado de envolvimento no esquema de corrupção que resultou na prisão de Arruda.
Em um dos trechos, Paulo Octávio afirma que, sem o apoio do DEM --seu partido até o início desta tarde-- não tem condições de governar o DF. O governador interino pediu desfiliação do partido hoje para evitar que fosse expulso da legenda.
Veja abaixo a íntegra da carta de renúncia de Paulo Octávio:
"Excelentíssimo Senhor
Presidente da Câmara Legislativa do Distrito Federal
Excelentíssimos senhoras e senhores deputados distritais
Ao longo de duas décadas fui distinguido por servir ao Distrito Federal e a sua população. Durante esse período recebi apoio, consideração e a confiança dos eleitores dessa cidade que, em pleitos sucessivos, sufragou meu nome para deputado federal, senador e vice-governador.
Assumi, interinamente, o governo do Distrito Federal com o propósito de colaborar para a superação da grave crise política que se abate sobre Brasília. Considerei desde o início que só poderia desempenhar essas funções se pudesse construir um possível consenso sobre a melhor maneira de vencer os atuais impasses.
Dediquei-me, nos últimos dias, a realizar consultas junto a líderes partidários dos mais variados matizes. Busquei a interlocução com figuras representativas da sociedade. As negociações apenas tornaram mais claras para mim as dificuldades de garantir, neste momento, a tão necessária governabilidade para o Distrito Federal.
Contudo, recebi manifestações de apoio e solidariedade de secretários, parlamentares, amigos, familiares, e de parte da população. Por essa razão, adiei por alguns dias o anúncio da decisão que há havia tomado. Diante dos desdobramentos recentes do processo político local, cheguei a uma conclusão definitiva.
Assim, por intermédio deste documento, comunico ao presidente da Câmara Legislativa minha renúncia ao cargo de vice-governador do Distrito Federal. Assumi o governo do Distrito Federal, de maneira interina, em condições excepcionalmente difíceis. O titular está privado de sua liberdade, por decisão judicial. No entanto, continua a ser o governo da cidade.
Pode, portanto, em tese, retornar às suas funções a qualquer momento. Não há sentido em aprofundar uma gestão nessas circunstâncias. Existem diversas obras, por toda a cidade, em fase de execução. São trabalhos contratados que possuem prazos e projetos definidos. Não deverão ser afetados pela situação política. É o que eu espero.
Permanecer no cargo, nas circunstâncias que chamei de excepcionais, exigiria a criação de condições também excepcionais. Imprescindível contar com apoio político suprapartidário para que todas as forças vivas do DF, juntas, pudessem superar a perspectiva de intervenção federal. Além disso, seria imperioso construir uma agenda mínima de consenso com amplo respaldo na sociedade. Ainda mais fundamental seria estabelecer os interesses da cidade acima das ambições políticas em meio às paixões do ano eleitoral. E, não menos importante, teria que receber respaldo do meu partido.
Nenhum dessas premissas se tornou realidade e, acima de tudo, o partido a que pertencia solicitou a seus militantes que deixem o governo. Sem o apoio do DEM, legenda que ajudei a fundar no Distrito Federal, e a qual pertenci até hoje, considero perdidas as condições para solicitar respaldo de outros partidos no esforço de união por Brasília.
Não é saudável para o governante, nem para os governadores, ver sua administração fragilizada. Sem que existam condições políticas, torna-se impossível permanecer à frente do Poder Executivo local, sobretudo, repito, em circunstâncias tão excepcionais.
Sempre sonhei ser governador do Distrito Federal. Trabalhei para alcançar esse objetivo. Mas em situação de plena normalidade. Não posso, nem devo, contribuir de nenhuma maneira para gerar desagregação e desassossego para o brasiliense.
Não tenho receios. Respondo, tranquilamente, por todos os meus atos. Minha história é longa em Brasília, aonde cheguei em 1962. Vivo aqui há 48 anos. Trabalho desde os 15. Aqui constitui família, aqui nasceram os meus filhos. Sou um legítimo candango.
Amo esta cidade. Conheço-a profundamente. Aqui estão minhas raízes e meu futuro. Por essas razões, decidi que o melhor a ser feito, neste momento, é deixar o honroso cargo de vice-governador do DF. O excelentíssimo senhor presidente da Câmara Legislativa possui as atribuições constitucionais para exercer as funções de chefe do Executivo.
Quero dizer que todos os esforços que realizei para garantir as condições mínimas de governabilidade tiveram como objetivo maior evitar que a autonomia política e administrativa do Distrito Federal venha a ser gravemente afetada por decisão judicial. Foi essa minha única motivação nos últimos dias.
Com minha renúncia, pretendo oferecer às forças políticas a oportunidade de restabelecer seu poder e, sobretudo, ao apaziguar os ânimos, garantir ao brasiliense a recuperação de sua autoestima. Quanto a mim, deixo o governo, saio da cena político e me incorporo às fileiras da cidadania.
Que Deus ilumine nossas decisões e nossos atos.
Atenciosamente,
Paulo Octávio."
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