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quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Dirceu: ‘Não tenho impedimento para dar consultoria’




Folha
O deputado cassado José Dirceu (PT-SP), hoje titular do escritório de JC Consultoria, levou ao seu blog uma nota sobre o noticiário que o envolve.

Trata da reativação da Telebras e dos benefício$ que a ressurreição da estatal pode proporcionar a um de seus clientes.

Desde o título, Dirceu investe contra o jornal que trouxe à luz a transação: “Folha joga sujo para atacar plano de banda larga do governo e me atingir”. Declara-se “surpreendido” com a manchete do jornal –“Nova Telebras beneficia cliente de Dirceu”.

O neoconsultor Dirceu havia sido procutado na véspera. Recebera informações prévias acerca do conteúdo da notícia. Supresa não houve. Acha que a reportagem foi “preparada sob encomenda”. De quem? Não diz. Para quê? Dois objetivos, segundo ele:

1. “Atacar o PNBL (Plano Nacional de Banda Larga) do governo federal”.

2. “Levantar suspeitas sobre minha participação em uma disputa que corre na Justiça do Rio, entre os credores da empresa Eletronet, seus sócios privados e o governo, pelo controle do ativo de 16 mil km de fibras ópticas”.

A notícia comentada por Dirceu não contém ataques ao PNBL. Suspeitas? Se existem, decorrem da movimentação de Dirceu, não da reportagem que a revelou. Dirceu escreveu:

“Exista ou não o PNBL e a reorganização da Telebrás, os credores, os proprietários da Eletronet e o governo federal terão que responder pelos passivos e ativos da Eletronet. E cada um poderá ser prejudicado ou beneficiado”.

Verdade. Mas o que chama a atenção é o fato de o cliente de Dirceu figurar no rol dos que poderão ser beneficados. Chama-se Nelson dos Santos. É sócio da Eletronet, dona dos 16 mil km de fibras ópticas que a “nova” Telebras pretende utilizar.

Na pele de consultor, o deputado cassado realça: “Já existe liminar favorável ao governo”. Concedeu-a a Justiça do Rio. Determina “a reintegração de posse de parte dos ativos da Eletronet (as fibras ‘apagadas’ ou não utilizadas atualmente) a empresas do grupo Eletrobras”.

E daí? “Sugerir que minha atuação na consultoria que dei sobre rumos da economia na América Latina tenha algo a ver com uma possível decisão que não cabe ao governo, mas ao Poder Judiciário, é uma ilação descabida e irresponsável do jornal”.

Procurado na véspera, Dirceu recusara-se até mesmo a confirmar a consultoria. Manandara dizer, por meio da assessoria: “Se, por ventura, o ex-ministro tivesse dado consultoria ao sr. Nelson dos Santos, não poderia confirmar, por cláusula de confidencialidade, comum a contratos de consultoria”.

Agora, pelo menos já admite o que não é mais possível negar. Alvissáras! Não menciona o valor recebido: R$ 620 mil. Mas, em homenagem ao bom senso, não nega a cifra. Diz ter provido ao seu cliente dados sobre “os rumos da economia na América Latina”. Curioso, muito curioso, curiosíssimo!

Nessa matéria, decerto há em São Paulo consultores bem mais preparados do que Dirceu para vender conhecimentos. Mas Dirceu pede à platéia que acredite no seguinte: Nelson dos Santos achegou-se a ele atrás de luzes sobre a economia da América Latina.

Ao bater na porta da JD Consultoria, o empresário nem de longe pretendeu valer-se do prestígio do dono da empresa junto ao governo do PT, para encurtar distâncias. Afinal, como escreve Dirceu, a decisão é da Justiça. Bem verdade que, não houvesse a intenção de reativar a Telebras, o governo teria tomado distância da encrenca. Porém...

Porém, imaginar-se que Dirceu possa ter tido algum tipo de influência nos rumos do negócio “é uma ilação descabida e irresponsável do jornal”.

Dirceu reclama: Acusam-me “de estar por trás da criação da Telebrás e, pior, favorecendo uma empresa privada para a qual dei consultoria legal e registrada em contrato...”

“...Saí do governo há quase cinco anos. Não tenho impedimento para dar consultorias e não há nada que me ligue a qualquer intervenção ou ação do Executivo federal...”

“...Os responsáveis pela ação judicial e pelo PNBL são testemunhas de minha não participação ou intervenção na definição da política da União”.

Se alguém “acusa” Dirceu são os fatos, não a notícia que os iluminou. Se favoreceu ou não o seu cliente, é algo que precisa ser esclarecido.

Dirceu não está mesmo impedido de prestar “consultoria legal”. Mas seria ingênuo se imaginasse que não causaria estranheza sua relação com cliente tão interessado em decisões emanadas do governo. E ingênuo, convenhamos, Dirceu não é.

O ex-Todo Poderoso da Casa Civil sustenta, de resto, que nada há de estranho no fato de ter escrito sobre o tema –Eletronete, fibras ópticas e etc.—em textos que levara ao blog e a um jornal a que serve como articulista.

“Como em todas as questões importantes do país, manifesto minha posição publicamente em meu blog ou na imprensa”. Beleza. Mas por que diabos omitiu o fato de que prestava consultoria a um empresário interessado na coi$a?

Afora as explicações de Dirceu, também a Advocacia-Geral da União divulgou uma nota sobre a notícia incômoda. Não cita Dirceu. Mas esgrimiu argumentos semelhantes aos dele.

A certa altura, o documento da AGU anota: “Eventual reativação da Telebrás não vai gerar receitas ou direitos de crédito para a massa falida da Eletronet [...]”.

Nelson dos Santos, o cliente de Dirceu, pensa de outro modo: Acha que os sócios privados da Eletronet (ele incluído) têm direitos sobre o futuro que se abre na empresa.

Por quê? “A rede de fibras ópticas, mesmo após a falência [da Eletronet], nunca deixou de funcionar, em regime de continuidade de negócios, tendo sido permanente a manutenção".






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