Messias popstar. Essa é a imagem pintada em "Tom Cruise - Biografia não-autorizada", de Andrew Morton, recém-editado no Brasil pela Manole, em seu olhar sobre o ator que, só nos anos 2000, rendeu US$ 1 bilhão aos cofres hollywoodianos. Mais do que uma investigação jornalística (pautada pela polêmica) sobre a trajetória pessoal e profissional de Thomas Cruise Mapother IV, o livro de Morton é um ataque direto à religião de seu biografado: a cientologia, criada pelo escritor Lafayette Ronald Hubbard (1911-1986) em 1954, com dogmas que fundem ciência e divindade, defendendo abertamente a existência de vida alienígena. O astro da franquia "Missão: impossível" seria, segundo Morton, uma espécie de garoto-propaganda dessa crença. Falar em Cruise é falar em cinema e nos milhões de dólares que esse mercado representa. Mas, para Morton, ele é mais um sinônimo de fé - aliás, uma fé fanática -do que de arte.
"Mais do que qualquer outra estrela, Tom é um messias cinematográfico que, imbuído dos ilimitados poderes da celebridade, reflete e refrata todos os medos e dúvidas de nossos tempos em relação ao extremismo religioso e à globalização", definiu Morton ao jornal "The New York Times", durante o lançamento do livro nos EUA, em janeiro.
Com enorme impacto sobre a mídia americana, o livro de Morton chegou às livrarias em um momento delicado para o ator. Na ocasião, seu mais recente projeto, o thriller de espionagem "Valkyrie", previsto para estrear em 4 de julho, na concorrida temporada de verão americano, acabara de ser adiado para outubro, diante de problemas de produção e do boato de que o material filmado, sob a direção de Bryan Singer (de "Superman - O retorno"), teria ficado aquém do esperado. O filme, ambientado durante a Segunda Guerra Mundial, com Cruise no papel do coronel alemão Claus von Stauffenberg, envolvido em um atentado contra Hitler, acabou ficando para 2009. Com um agravante: um dos motivos do atraso nas filmagens foram protestos dos alemães contra a cientologia.
Especula-se que a Alemanha teria negado o pedido de Cruise, hoje responsável pela histórica produtora United Artists, para filmar lá, temendo que o longa-metragem estivesse ligado à causa cientológica. Morton deita e rola nessa hipótese, em um capítulo em que trata "Valkyrie" como (mais) um deslize de Cruise desde seu desligamento dos estúdios da Paramount Pictures, onde foi um astro-rei desde o sucesso de "A firma", de 1993. O livro sugere que, mais do que o fracasso de "Missão: impossível 3" - cuja bilheteria de US$ 133 milhões não compensou o investimento de produção -, o exótico comportamento de Cruise pesou nesse corte de relações.
Entrevista a Oprah e união com Nicole
Prestes a completar 46 anos (na próxima quinta-feira), Cruise, um nova-iorquino de Syracuse, que cresceu sob o impacto do divórcio de seus pais, cercado por irmãs responsáveis por incentivar nele um senso de perfeccionismo doentio, é apresentado por Morton a seus leitores como "um homem de contradições". Na biografia, ele escreve que o ator "é uma criança insegura que esperava uma pancada não merecida do pai, um adulto que buscava certeza e controle, um macho-alfa que fazia suas próprias cenas de ação, temendo que tivesse um desafio que não pudesse superar".
Diante desse olhar de Morton, é inevitável crer que o episódio em que Cruise assombrou seus fãs ao pular no sofá do programa de Oprah Winfrey, rasgando-se em declarações de amor a Katie Holmes (mãe de sua filha Suri, de 2 anos), em maio de 2005, serviu ao escritor como o estopim de sua pesquisa. Autor do best-seller "Diana: Sua verdadeira história", Morton dedica várias páginas a descrever o que houve na entrevista do ator a Oprah. Mas essa descrição é associada à idéia da histeria cientológica que, na visão do biógrafo, consome Cruise, justificando, por exemplo, depoimentos dele sobre o papel crucial que sua Igreja pode ter na guerra contra o terrorismo hoje em voga em seu país. "A cientologia conta com ferramentas que podem ajudar as pessoas a direcionar suas vidas", disse o ator em uma de suas "pregações".
Seu envolvimento com os paradigmas religiosos definidos por Hubbard, que já soma 20 anos, começou durante o relacionamento com a atriz Mimi Rogers, com quem Cruise foi casado de 1987 a 1990. Aliás, as ex-namoradas e as ex-mulheres do astro, assim como sua atual amada, Katie Holmes, têm um peso fundamental na narrativa de Morton, que insiste em defender o ator como um mulherengo inveterado desde a adolescência, período que ele analisa com um olhar quase cândido. Nicole Kidman, por exemplo, entra como uma parceira, cujo amor não resistiu à competição profissional. Conforme ela se firmava como atriz de talento, distanciando-se da sombra dele, seu casamento de 11 anos (coroado com a adoção de dois filhos) com Cruise foi ruindo, até acabar em divórcio.
Penélope Cruz, que namorou o ator de 2001 a 2004, entra no texto mais como uma longa aventura, do que como uma grande paixão. Mas o relato de Morton para a love story do casal serve para que o biógrafo explore a boataria de que Cruise seria gay. Embora trate o astro como heterossexual, o escritor levanta rastros de homossexualidade que vão alimentar a imaginação da imprensa marrom especializada em alfinetar estrelas. Uma vez mais, a provocação do autor contra a cientologia se faz evidente: David Miscavige, atual presidente da seita, teria um relacionamento mais do que próximo com Cruise, de quem é guru pessoal. Mas isso é apenas especulação. Certeza, Morton só tem uma: Cruise é um ícone de poder, mas não é imune à decadência, cavada por sua própria onipotência.
Abaixo, o making-of do filme "Valkyrie"
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