Após dois anos de sofrimento, por causa do uso de crack e de outras drogas, e vivendo sob o poder de traficantes, a garota conseguiu o direito de ser internada gratuitamente em uma clínica.
Com um jeito ainda de menina, alegre e agarrada a um travesseiro de coração, a garota foi internada ontem em uma entidade terapêutica da região metropolitana de Belo Horizonte. "Estou feliz, porque vou sair dessa vida de sofrimento e vou me curar", afirmou.
Antes de chegar a esse início de caminhada para a felicidade, a adolescente passou por uma história de horror, que envolveu quatro abortos espontâneos em dois anos. Com 12 anos, ela fugiu de casa e foi morar com uma gangue de traficantes na região leste de Belo Horizonte. A mãe, uma auxiliar de cozinha, procurou ajuda da polícia e do centro de assistência social do bairro, mas, sem sucesso, não conseguia sequer ver a filha que estava sob poder da gangue, se prostituindo e se drogando. "Ninguém me ajudava, me vi desesperada e tomando calmante para dormir. A gente ter um filho morrendo e não poder fazer nada é angustiante", afirma.
Há cerca de um mês a adolescente chegou em casa arrastada por marginais, após levar uma surra deles e entrar em estado de overdose. Mesmo assim, logo que melhorou ela voltou para a boca de fumo. Só no dia 3 de julho, quando foi esfaqueada pelo namorado, com o qual ela afirma que sempre saia na "porrada", a menina chegou na casa da mãe decidida a largar as drogas.
A própria adolescente procurou a ajuda da organização não governamental Defesa Social Contra Drogas, que acionou a Justiça e a Subsecretaria de Políticas sobre Drogas para internar a menina.
Segundo a defensora pública Adriane Seixas, o subsecretário estadual de políticas sobre drogas, Clóves Eduardo Benevides, foi intimado a providenciar uma vaga para a menor em 24 horas, sob pena de crime de desobediência. "Pretendemos fazer com que o Estado cumpra o seu papel e disponibilize sempre uma alternativa imediata para a falta de vagas". De acordo com o subsecretário, a vaga foi providenciada antes mesmo da intimação oficial, mas era necessário uma autorização do fórum da cidade onde a menina seria internada.
A falta de vagas para internação de dependentes é uma realidade em Minas. Quando se trata de adolescentes a situação é ainda pior. Segundo Benevides, são apenas 50 vagas disponíveis para menores em todo o Estado, em três entidades conveniadas.
Para o juiz Marcos Flávio Padula, da Vara da Infância e Juventude, o problema deveria ser prioridade para o governo. (JS)
Como foram esses dois anos que sua filha esteve sob o poder de traficantes? Foram terríveis. Os marginais esconderam a minha filha de mim. Eu rodava o bairro inteiro atrás dela e não a encontrava. O mais difícil era saber que eles tinham o domínio sobre a menina que eu pari e criei todos esses anos. Eles maltratavam a minha filha, ela sempre chegava com marcas de violência, queimaduras de cigarro.
Como a senhora conseguia ver sua filha? Ela só vinha para casa quando estava quase morrendo. Mas, mesmo sabendo quem tinha dado uma facada nela, eu não podia chamar a polícia porque a pessoa mora perto da minha casa e me ameaçava diversas vezes. Tive que mandar minhas outras duas filhas mais novas para a casa de um parente em outro bairro, porque elas estavam correndo riscos na nossa casa.
Como a senhora acha que vai ser agora que ela vai ser tratada? O meu sonho é vender a minha casa e encontrar um lugar digno para minha família, para receber a minha filha curada. Ela vai voltar a ser aquela menina linda que cantava e dançava e vai recuperar a infância que perdeu nas drogas. Por causa de tudo isso, ela parou de estudar na quinta série, era para ela estar na oitava série e estar começando o primeiro emprego. (JS)
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