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sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Filantropia no high society




ECONOMIA

Nº edição: 672 | Economia | 20.AGO - 21:00 | Atualizado em 23.08 - 18:46


Poucas coisas crescem tanto no Brasil como as doações feitas por milionários - desde que sejam públicas e badaladas

Por Márcia Pereira e Letícia Morelli


Ouça um resumo da matéria

Existe uma nova indústria no Brasil. E ela cresce num ritmo tão forte quanto os investimentos em petróleo, no agronegócio ou na construção civil. Basta abrir as colunas sociais dos principais jornais para encontrar exemplos a granel da generosidade empresarial.

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Eike Batista e a primeira dama: doações de R$ 2,5 milhões para a Escola do Povo Dona Marisa Letícia

Aliás, não se sabe o que vem primeiro: a filantropia ou a visibilidade numa coluna social. Num dia, doam-se equipamentos para os hospitais. No outro, angariam-se recursos para cursos profissionalizantes. E, em seguida, arrecada-se para o combate ao câncer de mama.

O evento mais marcante da semana passada girou em torno do cabeleireiro Wanderley Nunes, de São Paulo, que tem como cliente mais famosa a primeira-dama Marisa Letícia da Silva. Disposto “a fazer o bem” para o seu próprio coração, o cabeleireiro teve a ideia de realizar um leilão e telefonou para Eike Batista, o homem mais rico do País, dono de uma fortuna de US$ 30 bilhões.
“O Wanderley me ligou e disse que o presidente Lula viria. Aí, eu disse que viria se ele viesse. Depois recebi um telefonema da dona Marisa pedindo que eu viesse, e eu vim”, declarou o bilionário ao jornal Folha de S. Paulo.
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Wanderley Nunes levantou R$ 4 milhões sem ter um histórico de ações sociais
Graças à presença de Eike na noite, foram arrecadados R$ 4 milhões – além de pagar R$ 500 mil por um terno usado pelo presidente Lula, ele também decidiu doar R$ 2 milhões adicionais. “O meu evento foi o de maior valor arrecadado até hoje; ninguém jamais teve um leilão com tanto dinheiro”, disse Wanderley Nunes à DINHEIRO.
O problema é que, embora domine bem as tesouras, o cabeleireiro da primeira-dama ainda não possui nenhuma experiência com trabalhos sociais. Na prática, ele tem R$ 4 milhões na mão e várias ideias na cabeça. “Quero criar um curso profissionalizante na comunidade de Paraisópolis para formar cabeleireiros.
Os estilistas Gloria Coelho e Reinaldo Lourenço também querem fazer costura. E eu vou convidar chefs renomados para dar aulas de forno e fogão”, afirma. Wanderley até já batizou sua escola profissionalizante. “Podia ser em meu nome, mas não faço isso. Será Escola do Povo Dona Marisa Letícia”, diz ele, assegurando que todo o valor depositado na conta do instituto será auditado por firmas independentes.
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O ex-ministro Paulo Renato e o médico David Uip num leilão em prol da saúde
Dois dias antes do evento promovido pelo cabeleireiro, ricos e famosos também se reuniram no Jantar dos Cozinheiros, promovido pelo médico David Uip, no restaurante A Figueira Rubayat, em São Paulo.
O objetivo era arrecadar recursos – cerca de R$ 30 milhões – para a reforma do Instituto de Infectologia Emílio Ribas. Presente ao jantar, o empresário Joseph Safra foi um dos principais doadores, mas, ao contrário de Eike Batista, não fez alarde e saiu sem dar declarações.
“O dinheiro vem porque tenho credibilidade”, disse Uip à DINHEIRO. “Ser médico e atender alguns dos doadores também ajuda porque a relação de confiança já está estabelecida.” Uip afirma que, entre seus tradicionais doadores, estão o empresário Eduardo Souza Ramos, à frente da Mitsubishi no Brasil, e a família Klabin.

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Objetos doados pelo modelo Jesus Luz no evento do cabeleireiro Wanderley
Na mesma semana, a esposa do candidato José Serra, Mônica Serra, também atuou como leiloeira em um evento beneficente, que vendia móveis customizados por celebridades. Mas teve que intervir para avisar que o dinheiro não iria para a campanha de seu marido, depois que a socialite Marina de Sabrit, outra leiloeira, pediu, no microfone, votos para José Serra. “Quero deixar claro que esse dinheiro não vai para outro lugar”, disse Mônica. O objetivo, segundo ela, era angariar recursos para o Instituto Se Toque, que combate o câncer de mama.
De acordo com especialistas, a filantropia ultrabadalada pode gerar dois efeitos. Um, positivo, o de estimular outros empresários a também doar. O segundo, perverso, seria o de direcionar recursos para eventos conduzidos por celebridades e sem um histórico efetivo de boas práticas sociais, prejudicando instituições mais sérias.
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Nos EUA, Bill Gates e Warren Buffett lideram as ações filantrópicas
No Brasil, embora não haja um cálculo preciso, há sim uma tradição filantrópica por parte do setor produtivo. O empresário Antônio Ermírio de Moraes, do grupo Votorantim, é há várias décadas um dos mantenedores do hospital Beneficência Portuguesa, em São Paulo.
Ele também apoia a Associação Cruz Verde, que combate a paralisia infantil, sem jamais ter feito nenhum alarde em torno disso. Nos Estados Unidos, onde a filantropia já está enraizada na cultura e nos valores, o melhor exemplo veio dos bilionários Bill Gates, da Microsoft, e Warren Buffett, da Berkshire Hathaway, que conseguiram convencer 40 bilionários a doar metade de suas fortunas para projetos de caridade.
Buffett foi ainda mais longe. Disse que doará 99% dos seus US$ 46 bilhões. “O empresário que doa sente-se redimido da culpa de ser muito mais bem-sucedido que a maioria das pessoas”, diz o infectologista David Uip. “É como se pagassem uma dívida com Deus”. Mas, segundo a Bíblia, o melhor é que se doe de forma discreta. “Não saiba a vossa mão esquerda o que dê a sua mão direita”, diz o versículo, que consta do livro de Mateus.


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