Complexa, confusa, pesada, pouco transparente e injusta.
Esta é a estrutura tributária brasileira.
Impostos sobre o consumo respondem por 47% da arrecadação (Noel Hendrickson)
População desconhece quanto paga exatamente em impostos que incidem sobre o consumo
Brasileiros de todas as classes sociais e regiões do país sabem que pagam impostos quando consomem. A conclusão está exposta no livro O Dedo na Ferida: Menos Imposto, Mais Consumo (Editora Record, 196 páginas), do cientista social e sócio-diretor do Instituto Análise, Carlos Alberto Almeida. Tal como em seu best-seller A Cabeça do Brasileiro, o autor expõe no livro as conclusões de pesquisa realizada em todo o país. A que deu origem a O Dedo na Ferida foi realizada no ano passado e revela que, apesar de a população estar ciente de que é tributada ao adquirir bens e serviços, a maioria desconhece a proporção dos impostos embutidos nos preços finais. Os que se arriscam a adivinhar, tendem a ser generosos com o governo e respondem que o volume de impostos é bem menor do que realmente é. Neste sentido, o livro se propõe a jogar luz sobre uma grave deficiência do complexo sistema tributário nacional: o fato de muitos impostos que pesam sobre a economia serem invisíveis ao contribuinte.
O expressivo desconhecimento da população sobre o quanto é tributada no consumo de bens de serviços – 47% da arrecadação provém daí – tem razão de ser. A estrutura tributária brasileira é tão embaralhada que é praticamente impossível saber com precisão quanto se paga de imposto em cada produto. A principal explicação é que, além dos chamados impostos indiretos (PIS, COFINS, IPI, ICMS etc.), que incidem sobre o consumo e cujo impacto no preço final é mais fácil de estimar, existem diversas outras taxas que se diluem nos custos das empresas e acabam sendo transferidas em maior ou menor grau ao consumidor. Está dada a receita para umas das maiores cargas tributárias do mundo, equivalente a 33% do PIB.
A consequência direta do desconhecimento por parte da população do quanto transfere de sua renda aos cofres do governo é a ignorância sobre o tamanho do estado. Para Enlinson Carvalho de Mattos, professor de Finanças Públicas da Fundação Getúlio Vargas (FGV), um sistema tributário mais transparente possibilitaria ao contribuinte ser um fiscal da utilização dos recursos arrecadados via impostos. “Um sistema mais transparente geraria, portanto, mais cobrança dos governos pelo bom uso do dinheiro público. É como se a população passasse a exigir a contrapartida pelo dinheiro que entregou ao estado”, afirma.
Além de pouco transparente, a estrutura tributária do país pesa sobre o setor produtivo – e indiretamente sobre os consumidores – por sua complexidade. “As empresas brasileiras gastam uma fortuna só para cumprir obrigações acessórias. Isso acaba virando um ônus que é repassado ao consumidor”, explica o consultor tributário Clóvis Panzarini.
Distorção social – Complexa, confusa, pesada, pouco transparente. E também injusta. A estrutura tributária brasileira, por possuir grande quantidade de impostos que incidem sobre o consumo, tem a característica de ser “regressiva”. Em outras palavras, ela tributa igualmente os desiguais. O sistema acaba por penalizar os mais pobres, que têm de arcar, com uma renda menor, com a mesma quantidade de impostos embutidos nos preços dos produtos.
Um estudo da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) revela que uma família que ganha até dois salários mínimos tem 45,8% de sua renda corroída pelos impostos indiretos. Essa proporção diminui consideravelmente conforme a renda da família aumenta. “Os impostos sobre consumo e serviços não levam em conta a capacidade contributiva das pessoas”, explica Letícia do Amaral, advogada tributarista e vice-presidente do Instituto de Planejamento Tributário (IBPT).
Para calibrar o peso tributário conforme a capacidade contributiva, a solução seria migrar a incidência da carga tributária mais para a renda e menos para o consumo, sugere Maria Helena Zockun, economista e coordenadora de pesquisas da Fipe. A despeito de ser complicada politicamente, a professora defende a urgência de uma reforma. “É complicada porque é transparente. O contribuinte sabe quanto está pagando e o político não quer que ele saiba. Por isso não acontece nada”, lamenta.
A acadêmica argumenta que a regressividade da carga tributária e sua transparência são temas que só serão levados a sério em campanhas eleitorais quando as classes populares tomarem consciência de seu papel como contribuintes. “Enquanto o eleitor não souber, isso não pesa no voto. E enquanto não pesa no voto, não pesa na decisão política”, conclui.
Tamanho do estado - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem defendido publicamente a pesada carga tributária brasileira – de 33,58% do PIB, uma das mais altas do mundo. Sua justificativa é de que ela constitui condição fundamental para que o país possua um estado atuante. “Todos os países desenvolvidos, que têm sistema de bem-estar social, têm carga tributária bem mais elevada, em cerca de 50% do PIB”, comparou Lula, em julho.
Sua candidata à sucessão presidencial, Dilma Rousseff, repete o raciocínio. Em plena campanha, a ex-ministra tem afirmado que a carga tributária brasileira é razoável. Seu principal adversário, o tucano José Serra, diz o contrário: “Não concordo com a afirmação de Dilma que diz que a carga tributária é razoável: ela não é razoável”, afirmou o candidato no início de agosto. Segundo ele, a ex-ministra, ao falar sobre impostos, põe lado-a-lado o país com a Noruega e a Suécia, quando, na verdade, deveriam ser criados parâmetros de comparação com nações em desenvolvimento.
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