O debate presidencial ‘Folha-Rede TV’ foi o mais encarniçado da atual campanha. Uma espécie de luta de boxe de todos contra uma. Dilma Rousseff foi levada às cordas. José Serra socou para derrubar. Marina Silva distribuiu jabs.
Guarda levantada, Dilma esquivou-se do nocaute. E desceu do ringue como queriam seus treinadores: sem hematomas novos. E com cara de vítima. Sabia-se que o ‘Fiscogate’ e a denúncia de lobby na Casa Civil a converteriam em sparring.
Treinada, a pupila de Lula fez o que lhe cabia fazer. No caso da Receita, defendeu a apuração –“Doa a quem doer”. E refutou o vínculo com sua campanha. Quanto ao lobby, tomou distância. Esquivou-se de levar as mãos ao fogo pela ex-assessora Erenice Guerra, herdeira da cadeira dela na Casa Civil.
Disse que, por enquanto, Erenice merece sua confiança. Se houve malfeito, afirmou, é preciso adotar as “medidas mais drásticas”. Servindo-se da meia-verdade, alegou que a encrenca envolve apenas o filho de Erenice, Israel Guerra.
E saiu do corner com frases de efeito: "Não vou aceitar, que se julgue a minha pessoa com o que aconteceu com o filho de uma ex-assessora minha. [...] Isso cheira a manobra eleitoreira, sistematicamente feita contra mim e contra minha campanha”.
Mesmo no comitê de Serra, a tática da pancadaria é vista como recurso extremo. O objetivo é “produzir” um segundo round. Mas a equipe de marketing reconhece, em privado, que o excesso de punhos sujeita o candidato tucano ao “efeito bumerangue”.
O histórico das últimas campanhas mostra que ataque não costuma render votos. Pior: sujeita o “agressor” à rejeição. A candidatura de Dilma sofreria avarias se ela tivesse escorregado. Não foi o que aconteceu, contudo. Ao reagir, passou a impressão de segurança.
Dilma e o zunzunzum que a rodeia instilam dúvidas no eleitor de classe média, minoritário. O resto do eleitorado não costuma assistir a debates. É gente que precisa dormir cedo, para não perder o ônibus que a levará ao batente.
A certa altura, Serra dirigiu à antagonista uma pergunta sobre o “amor e afeição” que o governo Lula dedicara à ditadura do Irã. Dilma deu uma resposta protocolar. E Serra: “As pessoas sabem que eu não sou nem caluniador nem evasivo. Minha vida pública é bem conhecida. No seu caso, realmente não dá para dizer. Está ficando claro que é evasiva. Não responde...”
Na réplica, Dilma teve o seu melhor momento: “As pessoas não podem ser pretensiosas e acharem que são a dona da verdade. Lamento a tentativa sistemática do meu adversário de me desqualificar”.
Fez uma analogia entre a campanha e a guerra entre entre EUA e Vietnã. Um conflito em que os soldados americanos foram postos para correr por um inimigo que julgavam inferior. “Não subestime ninguém, candidato. O senhor não é dono da verdade. O senhor não é melhor do que ninguém”.
Serra tenta injetar uma dose de 2006 na disputa de 2010. O problema é que, na sucessão de quatro anos atrás, o escândalo era maior e as digitais petistas mais evidentes. O caso dos aloprados compradores de dossiê ganhara as manchetes em 15 de setembro de 2006. O placar do Datafolha de então era semelhante ao atual.
Lula ostentaria, uma semana depois da "alopragem", os mesmos 50% que Dilma tem hoje. Geraldo Alckmin tinha dois pontos a mais que Serra: 29%. A imagem do R$ 1,7 milhão apreendido pela Polícia correu os telejornais associada à cena dos petistas presos.
Para completar, Lula cometeu o erro de faltar ao último debate do primeiro turno. Tudo somado, Alckmin foi ao segundo turno. Agora, os petistas pilhados nas violações da Receita frequentam a periferia da legenda. Não há o monte de cédulas. E Dilma vem dando as caras nos principais debates.
O marqueteiro de Serra, Luiz Gonzalez, respondeu também pela campanha de Alckmin. Traz na memória a cena de um debate parecido com o deste domingo. Era início do segundo turno de 2006. Contra o conselho de Gonzalez, Alckmin fora à jugular de Lula.
O marqueteiro saiu do estúdio da TV Bandeirantes festejado. Em análise posterior, Gonzalez diria, a portas fechadas: “O Alckmin perdeu a eleição ali”. De fato, o tucano teria no segundo round menos votos do que colecionara no primeiro. É esse Alckmin do segundo turno que Serra se arrisca a repetir no primeiro.
Não se pode dizer que todos os eleitores estejam alheios aos escândalos. Dilma decai em duas faixas específicas e minoritárias do eleitorado. Mas, por ora, quem se beneficia é Marina, não Serra.
Dilma deslizou cinco pontos entre os eleitores de maior renda. Marina ganhou quatro. A petista despencou sete pontos entre os mais escolarizados. A verde abocanhou seis. São movimentos que não afetam ainda os grandes números da pesquisa.
O PT aposta que a onda de classe média não contaminará o grosso do eleitorado. Serra confia no contrário. O debate deste domingo, de audiência limitada, não se revelou capaz de produzir movimentos bruscos.
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