Autor(es): Gustavo Loyola |
Valor Econômico - 28/06/2010 |
Sob o prisma da responsabilidade fiscal, o Congresso Nacional vem se transformando num verdadeiro circo dos horrores. À recente aprovação do fim do fator previdenciário e do generoso aumento real para os aposentados, soma-se a ameaça de aprovação da "emenda Paim", que vincula o reajuste de todas as aposentadorias à variação do salário-mínimo, assim como da emenda que extingue a contribuição previdenciária dos inativos e pensionistas do setor público. A continuar desse modo, dificilmente o país conseguirá manter a estabilidade macroeconômica nos próximos anos. São várias as causas do festival de atentados à responsabilidade fiscal que ora grassa no legislativo brasileiro. Nesse sentido, a proximidade das eleições é apenas uma das causas a exacerbar tal desvio no comportamento parlamentar. Na raiz do problema, está a quase total falta de "accountability" do Congresso quando se trata de temas relativos à higidez das finanças públicas. Ou seja, o Legislativo não se sente obrigado a prestar contas de suas ações à sociedade quando se trata de aumentar o déficit público. Por causa disso, "bondades" com o chapéu alheio são distribuídas a torto e a direito pelo Congresso, como ocorreu no caso da votação da extinção do fator previdenciário. Nesse caso, quem pagaria o pato caso o presidente de Lula não tivesse a sensatez de vetar a iniciativa seriam principalmente as gerações futuras, condenadas a arcar com o ônus de sustentar um número crescente de aposentados, em uma população economicamente ativa proporcionalmente cada vez menor. Isso sem contar com o risco do desequilíbrio das contas públicas que comprometeria a estabilidade macroeconômica e o crescimento sustentado da economia brasileira. A atual crise fiscal da Grécia e de outros países europeus nos relembra dos riscos associados ao descontrole fiscal. Na literatura econômica tradicional, o endividamento excessivo dos governos é considerado como obstáculo ao crescimento econômico, tendo em vista o aumento permanente dos custos para sociedade, normalmente sob forma de uma carga tributária maior, pela necessidade de honrar o serviço da dívida. Mas, como assinalam Rogoff e Reinhart, os problemas do endividamento emergem no curto prazo porque os investidores podem duvidar da vontade dos governos de financiar a dívida pública de longo prazo, o que leva às chamadas "crises da dívida". Não apenas os agentes privados estão sujeitos a surtos de excesso de confiança e de exageros no endividamento. O setor público padece dos mesmos defeitos, havendo vários episódios históricos, em diferentes períodos e continentes, que demonstram a frequente miopia dos governos que incorrem em excessivos déficits fiscais quando há facilidades para o financiamento de seus gastos. No caso mais recente, Grécia e alguns outros países aproveitaram-se dos benefícios associados à sua adesão à Comunidade Europeia e à zona do euro para elevaram seus déficits e suas dívidas públicas. Enquanto a economia mundial surfava no otimismo (que também levou à crise do "subprime"), tudo corria bem, já que o mercado absorvia toda emissão adicional de dívida. Entretanto, bastou a mudança do humor do mercado, para que se instalasse uma crise de confiança que praticamente paralisou a rolagem da dívida grega. Para nós brasileiros tais riscos não deviam ser desconhecidos. Desde sua independência, o país passou por várias crises da dívida pública, sendo uma das mais graves a crise de 1982, cujas consequências perversas atrapalharam o desempenho da economia brasileira por vários anos. Apenas mais recentemente, graças às reformas institucionais importantes - como a Lei de Responsabilidade Fiscal - e à continuidade de uma política de geração de robustos superávits fiscais, pôde o Brasil fugir do fantasma do calote da dívida pública, fato que foi reconhecido e premiado pelos mercados com a diminuição do prêmio de risco-país e a conquista do grau de investimento. Desgraçadamente, por detrás desse sucesso recente podem estar escondidos os nossos fracassos futuros. Apesar do ambiente internacional não muito favorável, o Brasil vem desfrutando de condições excepcionais no que concerne à confiança macroeconômica por causa dos bons fundamentos de sua economia. Porém, tal situação, em vez de fortalecer o apego da classe política à responsabilidade fiscal, está conduzindo a um relaxamento geral, levando gradualmente o Brasil a seguir uma receita que já deu errado aqui mesmo e em outros países. Reformas sensatas, muitas delas adotadas em momentos de crises, estão sob ameaça do furor recente do Congresso, como é o caso do fator previdenciário e da contribuição dos inativos. Para agravar a situação, o governo Lula parece ter tirado as lições erradas da crise econômica internacional. Ao contrário do alardeado, o Brasil não precisa de maior presença do governo na economia e nem da expansão desenfreada dos gastos públicos e do crédito dos bancos estatais. Neste clima, em que o Congresso e o Executivo competem pelo aumento do gasto público, é de se temer pelo futuro da estabilidade econômica no Brasil. |
quarta-feira, 11 de agosto de 2010
Circo dos horrores
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