Plantão | Publicada em 20/05/2011 às 10h37m
Paulo FranciscoNATAL - Amanda Gurgel de Freitas, a professora de 26 anos que chamou a atenção do país para os problemas da educação no Brasil, com um depoimento que ficou entre os mais vistos no Youtube, diz que hoje o professor no Brasil sofre de crise de identidade e também está doente. Militante do PSTU, ela recebe salário básico de R$ 930 como professora da rede municipal e de R$ 1.217 no estado. Tem especialização em educação para adultos, mas não está em sala de aula. Amanda pediu troca de função depois de uma depressão e agora trabalha na biblioteca do Colégio Estadual Miriam Coeli e no setor de informática numa escola municipal de Natal. No estado, os professores estão em greve por melhores salários.
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A senhora esperava toda essa repercussão, no YouTube, com seu depoimento sobre a situação da educação?
AMANDA GURGEL DE FREITAS: Nunca. Eu jamais imaginei que uma situação, que para mim é tão corriqueira e tão óbvia para todo mundo, pudesse ter uma abrangência tão grande. Não tem quem não veja como é a rotina de um professor.
O que a senhora acha que está faltando para mudar a situação do professor?
AMANDA: Posso falar sinceramente: vergonha. Esse caos que existe na educação não é um caos desorganizado, entre aspas, é um caos preparado, existe uma intenção para que a educação funcione desse jeito, para que os filhos da classe trabalhadora jamais atinjam altos níveis de cultura, para que no máximo eles aprendam um ofício.
A senhora hoje tem dois empregos, acorda às 5h da manha e passa o dia todo trabalhando. Como é a vida de um professor sem condições até de se qualificar, de ler? Como faz para se atualizar?
AMANDA: Olha, é muito difícil. Para qualquer professor, isso é muito difícil. Então, na nossa categoria, até é importante tocar nesse ponto, nós vivemos uma certa crise de identidade, porque enquanto a nossa atividade sempre foi considerada intelectual, e ainda hoje leva esse nome de uma atividade intelectual, de formadores de opinião, a verdade é que nós estamos passando por um processo de proletarização, que está se acentuando a cada dia. E a nossa atividade é principalmente manter o aluno em sala de aula, independente de qualquer coisa. Por isso que muitas vezes as pessoas confundem os responsáveis pelo caos e acham que a greve atrapalha os alunos. Na verdade, a greve não atrapalha, justamente por isso, se nós não estivéssemos em greve não teríamos a oportunidade de falar sobre a educação nesse momento, porque estariam todos os alunos dentro da sala de aula controlados pelos professores, que não estariam em condições de ter uma atividade digna, de exercer a atividade docente decentemente, porque as salas são superlotadas, porque as salas são quentes aqui na nossa cidade, porque os professores não têm condições de se atualizarem. Infelizmente, não é dada essa oportunidade para os professores.
A senhora disse que o professor sofre muito de doenças psicossomáticas. A senhora já teve depressão. Como é a saúde dos professores?
AMANDA: Os professores são submetidos a uma jornada de trabalho que é extenuante, sem ter condições de trabalho dígnas. Frequentemente desenvolvem doenças relacionadas à atividade profissional e, em troca, recebem por parte dos governos mais uma forma de opressão, que é impedí-los de darem entrada em licenças médicas ou em readaptação de função. Recentemente, em um consultório, um médico disse que não poderia fornecer um laudo para encaminhar um paciente a uma junta médica porque hoje em dia professor e policial são todos assim, querem ganhar dinheiro sem trabalhar. Dentro do consultório médico ele defendeu a política do governo do estado, dizendo que o governo está muito certo mesmo. Independente do seu estado de saúde, o professor tem mais é que estar em sala de aula. Isso só reforça essa ideia que para o governo educação de qualidade é aluno controlado dentro de sala de aula, independente da condição dessa aula e das condições de saúde do trabalhador.
Depois do sucesso na internet, a senhora pretende se candidatar a algum cargo político?
AMANDA: Nunca pensei sobre isso, não pretendo no momento. Talvez as pessoas possam achar que eu fiz isso por interesse. Mas minha militância é pelas demandas da nossa categoria e não gostaria que fossem confundidas com as do partido. Não tenho pretensão política governamental, mas faço política no meu dia a dia. As pessoas que me conhecem sabem de minha atuação. Talvez em outros momentos a conjuntura possa me levar para outros rumos.
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