João Pequeno, JB Online
RIO DE JANEIRO - Quatro meses após o início da pandemia, o Brasil se aproxima dos Estados Unidos na incômoda marca de país com maior número de mortes por gripe suína no mundo e, com 516 óbitos confirmados, está a apenas seis de alcançar os americanos, que, muito mais próximos do México, foco inicial da doença, também começaram a sofrer sua disseminação logo no início, em abril – no Brasil, o primeiro caso nova gripe suína foi confirmado somente no mês seguinte, maio.
O número de mortes no Brasil é calculado com base no boletim mais recente divulgado pelo Ministério da Saúde – no último dia 18, com dados até o dia 15 – mais os óbitos confirmados desde então pelas secretarias de saúde dos estados. Nesta quarta-feira, o Ministério da Saúde deve divulgar um novo boletim com dados atualizados.
Além do número absoluto de mortes, o Brasil se distancia de países como os próprios Estados Unidos na proporção de mortes por casos confirmados da doença, o que especialistas atribuem principalmente a uma provável subnotificação dos casos, o que, no entanto, também é apontado como fator prejudicial ao combate da pandemia.
Considerando o último boletim oficial do Ministério da Saúde, de 15 de agosto, o número de mortes confirmadas até então por gripe suína no Brasil (368) chegava a 9,91% dos casos registrados (3.712).
Na mesma data, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos registrava 34.076 contágios pelo vírus H1N1, dos quais as 522 mortes confirmados até agora representam apenas 0,65% do total de pacientes.
Para Juvêncio Furtado, presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia, é impossível calcular uma mortalidade precisa por número de doentes.
– Seria um cálculo em cima de um número que a gente não tem, tanto pela quantidade de pacientes quanto pela população. Não é muito diferente dos Estados Unidos – afirma o médico, que aponta a falta de kits para diagnóstico como a vilã da história.
– É a lei da oferta e da procura. O que se sabe é que o Ministério da Saúde está liberando o kit só para casos graves.
De acordo com o Ministério da Saúde, o diagnóstico diferencial da gripe suína é de alta complexidade e não tem relação direta com o tratamento. Ainda segundo o ministério, “a medida foi anunciada há dois meses quando mais de 70% das amostras de casos suspeitos analisadas não eram influenza (gripe), mas outros vírus respiratórios”.
Para o infectologista Alex Botsaris, o problema foi justamente a estratégia do ministério de tratar somente os casos graves com tratamento específico para gripe suína, “enquanto os Estados Unidos trataram todas as pessoas que aparentassem sintomas e conseguiram segurar a mortalidade”.
Botsaris relaciona a disseminação do vírus H1N1 no Brasil à limitação do tratamento pelo governo, assim ocorreu na Argentina, e refuta a versão de que a mortalidade só estaria diminuindo nos países do Hemisfério Norte por eles estarem no verão – estação menos propícia à gripe.
– Na Austrália, país do Hemisfério Sul, também no inverno, o governo liberou o medicamento para pacientes com sintomas e o índice de mortes é bem menor.
Segundo o site do Ministério da Saúde australiano, são 132 mortes por gripe suína para 33.844 casos confirmados – proporção de 2,5%, bem inferior à brasileira.
Edmilson Migowsky, professor de doenças infecciosas da UFRJ, critica outra justificativa do governo brasileiro, de limitar remédios recomendados para a nova gripe, como o Tamiflu, para evitar resistências ao vírus. – Países que liberaram a medicação tiveram redução nas mortes. Na Inglaterra houve resistência ao medicamento, porque os ingleses foram medicados. Então, acontece assim: a Inglaterra fica com a resistência ao medicamento, a gente fica com as mortes. O que é melhor? Não é preciso pensar muito.
A falta de material para diagnosticar pacientes com a gripe suína pode ser resolvida pelo método estatístico de amostragens, afirma o infectologista Alex Botsaris, para quem este mecanismo poderia ajudar a vencer o problema da subnotificação de casos.
– Quando não se pode diagnosticar todo mundo, você faz assim: determina algumas populações específicas. Elege, aqui no Rio de Janeiro, por exemplo três municípios de acordo com características representativas da população total, da mesma forma que fazem em pesquisas eleitorais. Nesses municípios, faz o teste e o diagnóstico em todos os pacientes com sintomas e tira a porcentagem média que deverá ter em cada local de acordo com sua população.
A medida, segundo Botsaris, serviria para distribuir corretamente o medicamento próprio para a pandemia da nova gripe. – Cada hospital, posto de saúde etc. teria a quantidade adequada de Tamiflu ou o medicamento genérico paara o atendimento com base estatística – explica o infectologista que, no entanto, não vê relação entre a notificação e a mortalidade.
– As mortes têm mais a ver com a estratégia de tratar só quem está grave. Como o medicamento para a gripe só age até os dois primeiros dias após aparecerem os sintomas, depois é o organismo do paciente contra o vírus. O quadro se torna grave geralmente neste estágio. Receitar o medicamento somente quando ele já é inócuo é uma das consequências de tratar somente os doentes graves.
Para o professor de doenças infecciosas da UFRJ Edmilson Migowsky, o Ministério da Saúde se precipitou em anunciar uma taxa de mortalidade baixa assim que a gripe suína foi confirmada no Brasil, em maio. – No início, só foram diagnosticados pacientes que haviam voltado de viagens e todos eles foram medicados conforme o tratamento específico indicado. A letalidade subiu quando o ministério abandonou esse tratamento.
Em nota, o Ministério da Saúde negou que tenha perdido o controle da doença quando deixou de fazer a confirmação laboratorial de todos os casos.
22:14 - 25/08/2009
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