O deputado que declarou estar se lixando para a opinião pública entrou num corredor polonês. É claro, um representante do povo não pode se lixar para seus representados. Mas a opinião pública também não é flor que se cheire.
Como se sabe, ela é covarde. Dependendo da direção do vento, se embola na salada de manchetes, faz o arrastão e joga reputações na vala — para depois conferir quem era. Até político honesto já caiu nessa.
O que aconteceu com a vida do cantor Wilson Simonal é uma página negra da história do Brasil — e da opinião pública. O filme “Ninguém sabe o duro que dei” vem dar esse beliscão na consciência nacional.
Simonal era um cantor espetacular que se deslumbrou com o sucesso e o dinheiro. Numa das entrevistas recuperadas pelo filme, o repórter pergunta se ele não acha que a fama o deixou mascarado. Simonal responde: “Eu sempre fui mascarado”. Um deslumbrado assumido.
Na escalada de prepotência, encomenda uma surra no seu contador, de quem desconfiara de roubo. Os capangas levam-no para o Dops, órgão de tortura da ditadura, e aí começa a brincadeira de telefone sem fio da coletividade.
Numa dessas saladas de quase-indícios que os juízes de arquibancada gostam de fazer, ligou-se o episódio do Dops com o fato de que Simonal cantava o Brasil, o Patropi, em pleno regime militar — e não se opunha ao governo. Daí passou a “informante da ditadura”, numa dessas acrobacias que o senso comum sabe dar.
Simonal foi banido da vida artística no auge, e antes de morrer em 2000 passou quase trinta anos enterrado no cemitério das reputações. Ninguém sabe, ninguém viu. Um fantasma moral.
No filme de Cláudio Manoel, Micael Langer e Calvito Leal, Chico Anysio faz a pergunta sangrenta: Quem foi delatado por Simonal na ditadura? Apontem um.
Não existe. O que existe é a covardia da opinião pública, que está se lixando para os fatos. Ela cairá dura no divã com esse filme.
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