Córregos passam por baixo de vielas e importantes vias da Zona Oeste sem ser notados pelos moradores. Grupos realizam expedições urbanas em busca de seus vestígios
Afonso Ferreira/Viviane Laubé
DIÁRIO SP
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O mapeamento deste e de outros córregos ocultos em São Paulo é objeto de estudo do professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP Vladimir Bartalini desde 2004. Segundo ele, a partir da década de 1950, esses riachos começaram a ser "enterrados", por conta da urbanização.
O Córrego da Água Preta sempre foi rejeitado devido ao despejo de esgoto e lixo em seu leito. Por gerar mau-cheiro e ser visto como causador de doenças, a população da época, na maioria operários, improvisou a canalização das águas. "O córrego foi canalizado sem seguir critérios técnicos, numa tentativa de afastar o problema", explicou o professor.
Também sob as ruas da região está o Córrego Verde. Um de seus braços formadores nasce na Rua Heitor Penteado, próximo à Estação Vila Madalena do Metrô. Ele passa sob a Rua Gonçalo Afonso, o "Beco do Batman", viela famosa pelos grafites nos muros das casas, cruza a Rua Fradique Coutinho e chega à Avenida Rebouças, onde se encontra com o segundo braço formador, vindo da Avenida Doutor Arnaldo, e segue até o Rio Pinheiros.
Para o professor Bartalani, esses córregos só poderão ser melhor utilizados quando a população souber da existência deles. "A conscientização é o primeiro passo. Depois, os moradores podem se organizar e reinvindicar a utilização do córrego na paisagem do bairro, por exemplo", afirmou.
Expedições urbanas Iniciativas como a do grupo Rios e Ruas buscam promover o redescobrimento dos rios soterrados por meio de expedições urbanas. O geógrafo Luiz de Campos Júnior estuda córregos escondidos em São Paulo. Há dois anos, ele se uniu ao arquiteto José Bueno para realizar viagens pela cidade em busca dos vestígios dessas águas pelas ruas. Seus cursos ser percebidos em degraus e ,por alguns bueiros, é possível ouvir o som das águas correndo.
"Muitos acreditam que os rios já morreram, mas quando vão ao encontro deles notam que estão vivendo em condições não-naturais", diz Bueno. Em várias viagens pela cidade, os "turistas" conseguem, até mesmo, chegar às nascentes destes rios, em plena cidade. Um dos exemplos mais curiosos é a presença de um escoamento de água por uma calçada da Alameda Rio Claro, Centro da capital, que logo depois volta para debaixo da terra.
Para os membros do projeto, esses personagens "vivos" do submundo têm relação direta com as enchentes. "O rio, quando não é canalizado, possui um caminho curvo. No entanto, quando ações humanas interferem em seu percurso, tornando-o reto, o córrego não tem por onde correr a não ser por uma valeta, sendo impossível dar vazão às suas águas. Quando há chuva, por não conseguir penetrar nos solos, a água acaba se tornando uma inundação", afirma Luiz.
Ao conhecer os rios, segundo eles, o respeito aos rios cresce. "Quem conhece, cuida. Para mudar a chave atual, as pessoas devem começar a ocupar as ruas, a andar por elas."
Urbanista defende reintegração de córregos à paisagem urbana
O mapeamento dos córregos ocultos feito pelo professor Vladimir Bartalini alerta para a possibilidade de melhor utilização dessas águas, que sofrem com o despejo de lixo e esgoto. Segundo ele, nunca houve esforço do poder público para isso. "Ao esconder e poluir estas águas, desperdiçamos a oportunidade de dar um tratamento digno aos espaços públicos", disse.
Bartalini vê no paisagismo a melhor utilidade para estes cursos d?água escondidos sob as ruas da cidade. "Imaginem como a região ficaria mais bonita com um rio correndo ao lado dos pedestres e ciclistas", observou.
O professor alerta que os córregos estão espremidos em meios às casas, tornando impossível resgatar a mata ciliar. "Resgatar a mata das margens demandaria a demolição de muitas casas em toda a extensão dos córregos. A melhor solução é usá-los na paisagem urbana." A Prefeitura de São Paulo não informou se há projetos de recuperação dos córregos ocultos da cidade.
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