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quarta-feira, 8 de junho de 2011

Crimes atribuídos a Battisti prescrevem com anistia

Dupla incriminação


Os quatro homicídios atribuídos pela Justiça da Itália ao ex-militante comunista Cesare Battisti são anteriores à Lei da Anistia (6.683/79). Com isso, a sua extradição significa uma dupla incriminação. O argumento é do advogado e ex-governador do Rio de Janeiro, Nilo Batista, em parecer feito a pedido da defesa de Battisti.

O texto do advogado, que ganhou notoriedade nos anos 70 como defensor de presos políticos, foi escrito em maio do ano passado para ser anexado ao processo de Extradição que corre no Supremo Tribunal Federal. No dia 13 de janeiro, o ministro da Justiça, Tarso Genro, concedeu refúgio político ao italiano, por entender que existe "fundado temor de perseguição”. O Supremo agora debaterá legalidade da decisão de Tarso. A decisão do ministro desagradou o governo italiano

“O princípio da dupla incriminação proíbe a extradição de alguém cuja conduta, no país requerido, teve sua punibilidade (rectius, sua criminalidade) extinta pela anistia. Os delitos atribuídos a Cesare Battisti são anteriores à Lei 6.683, de 28 de agosto de 1979. Todos os indivíduos, brasileiros ou estrangeiros, que os praticaram até aquela data — e tivemos, conforme mencionado, inúmeros casos — foram anistiados”, argumenta o professor de Direito Penal da Universidade Federal do Rio de Janeiro e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Os assassinatos foram cometidos em junho de 1977 e em fevereiro e abril de 1979.

Além disso, Nilo Batista argumenta que é notória a militância política de Battisti. Segundo ele, isso evidencia que a condenação à prisão perpétua por quatro homicídios teve viés político. O professor diz que o primeiro-ministro Silvio Berlusconi é de uma linha política próxima ao governo italiano dos anos 1970. Só esse fato torna impossível a extradição, diz.

“Será juridicamente admissível que possamos entregar Cesare Battisti à República Italiana, justamente quando uma inquietante nostalgia da falange fascista paira sobra a península, porém estejamos impedidos de punir qualquer dos brasileiros que, aqui ao mesmo tempo em que ele lá, praticaram sua mesma conduta?”, questiona.

Para Nilo Batista, um Estado Democrático de Direito, como o Brasil, não deve prescindir de observar de forma escrupulosa o princípio da dupla incriminação. Para ele, toda restrição a esse princípio é inconstitucional. “Sem isto, já a simples prisão provisória do extraditurus pareceria abusiva, sendo, como frisou [o jurista alemão Heinrich] Grützner, 'particularmente inaceitável (notamment inacceptable) que o Estado possa prender alguém para fins de extradição por um fato que, se houvesse sido cometido em seu território (dans ce pays), não poderia ensejar uma prisão preventiva'”, argumenta.

O terceiro argumento do ex-governador são os vícios formais do pedido de Extradição do governo da Itália. Segundo o professor, foi omitido por exemplo a primeira condenação de Battisti por conspiração por particiipar de "organização subversiva". Para ele, a decisão foi “omitida entre os documentos apresentados pelo Estado requerente por repreensível negligência na melhor hipótese ou lastimável violação do dever de verdade processual na pior”.

"A extradição de Cesare Battisti representaria um enorme equívoco, que por certo nossa Corte Suprema não cometerá. Um erro de interpretação jurídica permite, excluída a pena de morte, revisão, correção e até indenização; mas um erro de interpretação histórica costuma levar a resultados escabrosos”, afirma.

Nilo Batista cita o caso em que o Supremo não deu Habeas Corpus para Olga Benário em 1936. A então mulher do líder comunista Luís Carlos Prestes foi enviada à Alemanha nazista, onde foi morta em um campo de concentração.

Uma questão fundamental para se decidir a concessão ou não da extradição é saber se o que motivou o pedido é crime político ou crime comum. No caso de crime político não cabe a extradição e justifica-se o refúgio. Para Nilo Batista cabe ao país requerido — e não ao requerente — definir a questão. E foi isso que fez o ministro Tarso Genro ao conceder o refúgio a Battisti: considerou que o crime pelo qual foi pedida a extradição tem caráter político.

Na sexta-feira (23/1), a defesa protocolou um Agravo de Instrumento no Supremo pedindo a soltura de Battisti. No mesmo dia, o governo da Itália protocolou pedido de vista do processo de Extradição. A Itália quer ser ouvida sobre o pedido de liberdade feito depois que o ministro da Justiça, Tarso Genro, concedeu refúgio político a Battisti.

O advogado Antonio Nabor Areias Bulhões, que defende o governo italiano, garantiu que o processo não será julgado assim que o Supremo voltar ao trabalho, em 2 de fevereiro, já que pediu vista do processo. Segundo ele, as condenações de Battisti por quatro homicídios foram legítimas tanto na questão material quanto formal. “A decisão do Tarso é absurda e não se sustenta”, afirmou.

Battisti está preso preventivamente desde março de 2007 no Presídio da Papuda, em Brasília. Com 52 anos, ele é ex-dirigente dos Proletários Armados pelo Comunismo (PAC), grupo extremista que atuou na Itália nos anos 60 e 70. Ele foi condenado à prisão perpétua à revelia na Itália por quatro homicídios cometidos pelo PAC entre 1977 e 1979. Ele nega as acusações.


Para vítima, crimes de Battisti não são políticos

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CLAUDIO DANTAS SEQUEIRA
da Folha de S.Paulo

O italiano Alberto Torregiani, 45, é uma das vítimas do PAC (Proletários Armados pelo Comunismo). Em 16 de fevereiro de 1979, ele presenciou o assassinato do pai, o ourives Pierluigi, na calçada da joalheria da família, em Milão.

Alberto também foi atingido por um tiro e ficou hemiplégico. Em entrevista à Folha, por telefone, ele criticou a concessão de refúgio a Cesare Battisti. "Battisti é assassino comum, não criminoso político."

FOLHA - Seu pai foi morto numa ação do PAC atribuída a Battisti?
ALBERTO TORREGIANI - Sim. Íamos abrir a joalheria naquela manhã. Mas antes, alguém o chamou pelo nome e, quando ele se virou, a pessoa começou a atirar. Também fui ferido. Chamamos a ambulância, mas quando chegou ele já estava morto.

FOLHA - Battisti participou?
TORREGIANI - Desse crime não. Mas, segundo um de seus ex-companheiros, foi o mandante. Nesse dia, participou de outro assassinato.

FOLHA - Pierluigi tinha alguma militância política?
TORREGIANI - Não. Meu pai não tinha nada a ver com política. Era um comerciante. Acho que foi morto por vingança. Um mês antes, reagiu a um roubo e um membro do grupo do Battisti foi morto.

FOLHA - Qual sua opinião sobre o refúgio concedido pelo Brasil?
TORREGIANI - É um absurdo. Battisti disse que corre risco de vida na Itália, mas isso não é verdade. Ocorre que, se ele voltar, terá de pagar pelos crimes que cometeu.

FOLHA - Você acha que ele é um terrorista, um criminoso político?
TORREGIANI - Ele não é um criminoso político. Foi classificado como terrorista, por ter sido condenado pelos roubos e assassinatos. Sustentam que fazia isso pelo comunismo. Para mim, ele era um criminoso comum.

FOLHA - O PAC era conhecido como grupo político?
TORREGIANI - Nunca tinha ouvido falar. Depois soubemos que era um grupo armado que defendia o comunismo.


Crimes de Battisti não tiveram razões políticas, diz ex-chanceler
  • Agência ANSA
  • Domingo, 15/11/2009 - 22:37
    Roma - O ex-chanceler italiano Massimo D'Alema afirmou hoje que o ex-ativista de esquerda Cesare Battisti foi condenado na Itália "por graves crimes contra pessoas inocentes e não por razões políticas".

    Battisti foi condenado na Itália "por graves crimes contra pessoas inocentes e não por razões políticas, e é justo que cumpra a pena em nosso país, como é normal que aconteça", disse D'Alema após se reunir com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

    Lula chegou ontem a Roma para participar da Cúpula Mundial sobre Segurança Alimentar, da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), que acontecerá entre segunda-feira e quarta-feira desta semana.

    Questionado se o caso do italiano, que aguarda decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o pedido de extradição apresentado pela Itália, havia sido abordado com Lula, D'Alema disse que "não havia nenhuma razão para discutir um problema que deve ser examinado pela magistratura".

    Ainda segundo ele, o presidente brasileiro afirmou que "esta questão está nas mãos da magistratura, e será a magistratura que decidirá em alguns dias".

    Battisti foi condenado à prisão perpétua na Itália por quatro crimes cometidos na década de 1970, quando era membro do grupo Proletários Armados pelo Comunismo (PAC).

    Em janeiro, o ex-militante, que foi preso no Brasil em 2007, recebeu o status de refugiado político do ministro da Justiça, Tarso Genro. Contudo, a Itália pede sua extradição e o processo está sendo julgado atualmente pelo STF.

    Na primeira votação da Corte, realizada em 9 de setembro, o placar terminou favorável à extradição. No último dia 12, porém, o ministro Marco Aurélio Mello, que havia pedido vista do processo, empatou, votando a favor da permanência do italiano no país.



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