Plantão | Publicada em 22/01/2008 às 21h07m
Jornal NacionalSÃO PAULO - Parte de uma carga de cocaína apreendida pela polícia desapareceu em São Paulo. O piloto do avião que transportava a droga declarou que o carregamento era de 300 quilos. Os policiais anunciaram a apreensão de 200 quilos, mas nem a metade foi entregue à Justiça. A apreensão da droga ocorreu em 2003, no aeroclube de Itu, interior de São Paulo, mas só agora o caso está sendo investigado pela corregedoria.
Foram apreendidos aproximadamente 200 quilos de cocaína, segundo informação oficial do Departamento de Investigações Sobre Narcóticos (Denarc), o principal grupo da Polícia Civil de combate às drogas. Mas, na perícia, apareceu outro peso: 98 quilos. Ficou a dúvida: desapareceram 102 quilos? Ou teria sido uma estimativa errada na hora da apreensão?
Para tirar a dúvida, a reportagem do Jornal Nacional decidiu fazer um teste, com a ajuda de um perito criminal. A base de comparação é a imagem feita no dia da apreensão, com a droga dentro do avião. O mesmo modelo de aeronave, um Cesna 210, e farinha de trigo, que tem volume parecido com o da cocaína, foram usados na simulação. Para embalar a farinha, foi levado em conta as declarações dos policiais: eram cinco fardos, cada um com 20 pacotes em forma de tijolos, totalizando cem pacotes.
No avião, os sacos com cerca de 200 quilos foram colocados como aparecem na imagem do dia apreensão. Resultado: o volume dos fardos de farinha é bem parecido com o espaço que a cocaína ocupava.
- O importante nessa simulação é mostrar que a quantidade que tem nas imagens é compatível com 200 quilos e não com 98 quilos. A altura do pacote é exatamente a altura do pacote que está na imagem. É a mesma altura. Quer dizer, nós estamos muito próximos da embalagem que foi usada - disse o perito criminal Ricardo Molina.
Foi feita uma simulação com 98 quilos, o mesmo peso da cocaína que a polícia entregou para a Justiça. Para levar 98 quilos não seria preciso tirar qualquer banco do avião, como foi feito no dia do transporte da droga. No laudo, o perito afirma: "a carga de cocaína não poderia ser de 98 quilos".
- Esse avião, com certeza, tinha condição de transportar mais do que 200 quilos. Caberiam, tranqüilamente, mais três ou quatro fardos - assegurou o perito criminal Ricardo Molina.
Eram 300 quilos que o avião transportava, disse o piloto Mário de Jesus, em uma carta que escreveu da cadeia.
- Simplesmente roubaram 202 quilos - disse ele, na carta.
- Policiais desviaram a droga da apreensão original. Então, se alguém dentro das fileiras do estado está usando o brasão da corporação para traficar entorpecente, a investigação vai mostrar e essas pessoas vão responder por isso - afirmou o promotor de Justiça José Reinaldo Carneiro.
O delegado Robert Carrel, um dos policiais que participaram da operação, foi procurado. Hoje, ele ocupa um cargo de chefia no Departamento de Trânsito (Detran). Ele estava no prédio, mas não quis gravar entrevista. O delegado Luis Henrique de Moraes, que assina o auto de apreensão da cocaína, também foi procurado. Ele continua trabalhando no Denarc, mas também se recusou a falar.
O piloto que denunciou o sumiço da cocaína queria, em troca, redução da pena. Ele dizia que tinha sido ameaçado pelos investigadores que fizeram a apreensão.
- Tenho medo de ser morto por esses policiais do Denarc - ele escreveu.
Na ficha prisional do piloto consta: falecimento, oito meses depois da denúncia. Motivo: morte natural, dentro da penitenciária. O Ministério Público vai apurar também as circunstâncias da morte do piloto. A Delegacia Geral de Polícia informou que a corregedoria está investigando o caso.
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