Valter Cardeal, da Eletrobrás, e Adhemar Palocci, da Eletronorte, negociam fornecedores, construtores e os sócios da concessionária
Renée Pereira e David Friedlander, de O Estado de S. Paulo
SÃO PAULO - Às vésperas de assinar os últimos contratos para tirar a Hidrelétrica de Belo Monte do papel, o governo assumiu o controle total do empreendimento. Os homens do Planalto no comando da operação são Valter Cardeal, diretor da Eletrobrás e pessoa de confiança da presidenciável Dilma Rousseff, e Adhemar Palocci, diretor da Eletronorte e irmão do ex-ministro Antônio Palocci.
Desde o leilão, em abril, eles articulam a formação final da empresa que vai explorar a hidrelétrica por 35 anos. Nas mãos deles, está a escolha dos fornecedores de equipamentos, que envolve contratos de R$ 6 bilhões, e a contratação das empreiteiras para construir a usina, orçada pelo governo em algo como R$ 16 bilhões. Ao todo, Belo Monte custará perto de R$ 25 bilhões.
A usina foi apresentada pelo Planalto como um projeto privado, ficando fora das regras de licitações de obras públicas. Na prática, porém, o governo entregou a concessão para si mesmo. Hoje, o único papel das oito empresas privadas, que ao lado da estatal Chesf formaram o consórcio Norte Energia e venceram o leilão, é participar de encontros semanais para tomar conhecimento das decisões do governo.
Comandados por Cardeal e Palocci, os encontros ocorrem todas as quintas-feiras, sempre à tarde. O lugar não é fixo: às vezes ocorrem nos escritórios da Eletrobrás em Brasília ou no Rio de Janeiro e, de vez em quando, em um prédio da Vila Olímpia, em São Paulo. José Aílton Lima, diretor da Chesf e presidente do consórcio, também participa, mas é o que menos interfere.
Do outro lado da mesa, os representantes da Queiroz Galvão, JMalucelli, Serveng, Contern, Galvão Engenharia, Mendes Júnior, Cetenco e Gaia apenas ouvem o resumo da semana. Antes do leilão, todos eles tinham pré-acordos com fornecedores. Após a disputa, foram avisados que deveriam esquecer os arranjos e deixar tudo por conta da Eletrobrás. "Quem lidera o processo são a Eletrobrás, Eletronorte e Chesf, sócias das empresas privadas", diz Cardeal.
Essa submissão, que até agora fazia parte do jogo, começou a incomodar. Nos últimos dias, segundo fontes ligadas ao processo, representantes das empresas têm se queixado de que Cardeal e Palocci escondem deles informações estratégicas e suspeitam estar sendo passados para trás. O Estado conversou com várias fontes ligadas à operação, que contaram a mesma história em detalhes, mas pediram para não ser identificados. Cardeal nega: "Não existe atrito nenhum".
O ponto de discórdia está na definição de quem vai construir Belo Monte, terceira maior hidrelétrica do mundo. Como investidoras no empreendimento, as empresas do consórcio Norte Energia - quase todas da área de engenharia e construção - esperavam repartir entre elas as imensas obras civis da usina. Por contrato, elas têm preferência para trabalhar na obra, desde que ofereçam o melhor preço.
Elas pensaram que já estava tudo certo quando, semanas atrás, Cardeal e Palocci começaram a falar da necessidade de ter ao menos uma grande empreiteira na obra. "Reafirmo que nossas sócias têm absoluta condição de fazer a obra. E elas farão.", afirma Cardeal. "O que pode ocorrer é que uma ou outra empresa venha a somar. Algumas já nos procuraram, mas ainda não apresentaram proposta." Executivos da Camargo e Odebrecht, no entanto, disseram ao Estado já ter apresentado suas propostas.
As duas lideraram um consórcio para disputar Belo Monte, mas desistiram na reta final alegando que o preço desejado pelo governo, de R$ 19 bilhões, era inviável. Diziam que a obra custaria cerca de R$ 30 bilhões. A desistência provocou dúvidas sobre a realização do leilão, que tinha só um outro grupo interessado, liderado pela Andrade Gutierrez.
Foi nesse momento que o governo se mobilizou para montar o consórcio Norte Energia. Segundo fontes que participaram do processo, o próprio Cardeal, selecionou as empresas que, na sua visão, tinham credenciais para construir a usina.
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