Comandante do Batalhão de Choque da PM de São Paulo, o coronel Eduardo Félix veio à boca do palco para dar um lote de explicações sobre o caso de Santo André.
Estava acomanhado do comandante do Gate (Grupo de Ações Táticas Especiais) da PM, Adriano Jovenini. Eis o que disse, em essência, a dupla:
1. Eduardo Félix atraiu a encrenca para si –“Assumo toda e qualquer responsabilidade pelo ato”—defendeu a tropa—“ Deixo claro que o Gate não atirou nas vítimas”—e atirou no vazio: “Fizemos de tudo para proteger a vida dos três".
Até aí, nada de estranho. O que se ouve é a voz de um militar tentando dignificar a farda que veste.
2. Lindemberg Fernandes, o celerado que manteve duas meninas em cárcere privado por cinco dias, efetuara um disparo dentro do apartamento na manhã de sexta (17).
Por que a PM não agiu nesse instante? O coronel Félix alega que Lindemberg parecia, nessa hora, tranqüilo. Conversava com o negociador. Exibia bom humor. Tudo fazia crer, alega o coronel, que ele iria se entregar.
Neste ponto, é preciso cotejar as palavras do comandante da PM com outros testemunhos e com as fitas que registram o vaivém das negociações.
3. Adriano Jovenini, o comandante do Gate, acrescentou: os policiais têm como disntinguir, pelo som do tiro, uma bala disparada a esmo, que atinge o nada, de um projétil que penetra em algo ou em alguém.
“A equipe que ali estava [próxima do apartamento] pensou que ele disparou sem querer”, ecoou o coronel Eduardo Félix.
Sem querer? É, pode ser. Há, porém, uma dúvida: A ex-namorada de Lindemberg trazia duas balas no corpo. Uma na cabeça. Outra na virilha. Quem garante que uma delas não resultou desse disparo matutino?
4. A invasão do apartamento, no início da noite de sexta, foi motivada por outro disparo. Nesse instante, alega coronel Félix, o rapaz “estava com outro humor". Por isso a PM reagiu de forma distinta.
5. O cativeiro durou mais de cem horas. Por que a polícia não executou uma invasão planejada? Por que agiu à noite, aproveitando-se do sono do algoz das meninas?
Segundo o coronel Félix, embora conhecesse a disposição dos cômodos do apartamento, a polícia não tinha como saber onde dormia o rapaz.
Ao deixar o cativeiro, a amiga de Eloá informara à PM que ele dormia cada noite num lugar diferente. Por vezes, trancava as duas no quarto.
Aqui, mais uma interrogação: as chances de êxito não seriam maiores? Tranfiadas num quarto, as vítimas de Lindemberg não estariam fora da alça de mira do rapaz?
6. Por que a polícia não adicionou sonífero na comida e na bebida enviada ao apartamento? Adriano Jovenini, o mandachuva do Gate, diz o seguinte:
Um sonífero não surte efeito instantâneo. E Lindemberg, antes de apagar por completo, poderia pressentir a manobra e dar cabo das duas moças. Faz sentido.
7. Por que diabos a polícia permitiu que a amiga da ex-namorada, depois de ter sido liberada do cativeiro, retornasse ao apartamento? Ouça-se o coronel Eduardo Félix:
"O Lindemberg exigiu presença dela e do irmão da ex-namorada, que é seu melhor amigo. Ela não parou no limite combinado. Ninguém esperava que ela queria entrar no apartamento".
Mais: "Eu colocaria meu filho no lugar da amiga. Veja bem, é uma decisão de quem está la.” Difícil de concordar.
Se o coronel admite submeter um dos seus a risco, é problema dele e do filho. Mas jamais poderia ter permitido que filha alheia retornasse a uma cena da qual saiu com um tiro no rosto.
8. Abespinhado com o cipoal de críticas, Adriano Jovenini, do Gate, disse: "Quem tem condições de avaliar somos nós. Claro que algumas vezes não temos 100% do resultado desejado". Errado. Qualquer contribuinte em dia com os seus impostos tem o direito de "avaliar" a polícia que ajuda a remunerar.
Considerando-se as dimensões da tragédia, fica claro que a PM, tendo “condições de avaliar”, chegou a avaliações equivocadas. Tomando-se o caso pelo ângulo do “resultado”, chega-se a uma contabilidade macabra.
Havia três pessoas no apartamento. O jovem amaluco saiu ileso. Uma menina levou um tiro no rosto. A outra, alvejada na cabeça e na virilha, encontra-se à beira da morte. De fato, “não temos 100%”. Quanto teríamos: 10%? 5%? Daí para menos!
9. Lindemberg levou a cara à janela várias vezes. "Nós poderíamos ter dado o tiro”, reconheceu o coronel Félix. Por que não atitou?
“Era um garoto de 22 anos, sem antecedentes criminais e uma crise amorosa. Se nos tivéssemos atingido com um tiro de comprometimento, fatalmente estariam questionando por que o Gate não negociou mais...”
Perguntariam “...por que deram um tiro em jovem de 22 anos de idade em uma crise amorosa, fazendo algo em determinado momento em que se arrependeria para o resto da vida".
O coronel tem razão. Consumada a tragédia, parece óbvio que o tiro de misericórdia teria produzido um mal menor. Mas o que estariam dizendo agora aqueles que costumam condenar a truculência dos métodos policiais?
Escrito por Josias de Souza às 19h49
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