Chanceler disse que país 'queimou os dedos' no caso da questão nuclear.
Mas, segundo ele, ainda há esperança na adoção de um plano.
segunda (21) em Viena (Foto: /Hans Punz / AP)
O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, disse uma entrevista ao jornal 'Financial Times', publicada nesta segunda-feira (21) que o país está interrompendo seu papel de mediador no caso do programa nuclear iraniano, tema que, segundo o jornal, "trouxe as relações entre o governo Lula e a administração Obama para um nível mais baixo".
O ministro disse que o Brasil não buscaria mais apaziguar a disputa após os EUA terem rejeitado o acordo entre Irã e Turquia para que o país persa enviasse urânio para ser enriquecido pelos turcos. "Nossos dedos foram queimados por fazer coisas que todos diziam serem úteis e no final vimos que algumas pessoas não conseguem aceitar um 'sim' como resposta", disse Amorim referência indireta a Washington.
Potências ocidentais veem com desconfiança o acordo, mediado por Brasil e Turquia no mês passado, pelo qual o Irã entregaria 1.200 quilos de urânio baixamente enriquecido para em troca receber, no prazo de um ano, 120 quilos de urânio enriquecido a 20% para o seu reator de pesquisas médicas.
Dias depois do acordo, os EUA e seus aliados convenceram Rússia e China a aceitarem uma quarta roda de sanções do Conselho de Segurança da ONU ao Irã. Brasil e Turquia, que são membros temporários e sem direito a veto do Conselho, votaram contra. Foi a primeira vez que uma resolução contra o Irã não teve unanimidade.
Amorim disse ao jornal que, "se formos chamados [para negociar novamente], talvez ainda sejamos úteis, Mas não agiremos de maneira pró-ativa ao menos que sejamos solicitados."
O jornal citou uma autoridade experiente da administração Obama dizendo que a decisão brasielira era bem-vinda. Segundo o jornal, os comentários de ambos os lados mostram as "cicatrizes" que ainda restam na disputa em relação ao Irã.
De acordo com a assessoria de imprensa do Itamaraty, as declarações do ministro não diferem da posição adotada desde a primeira entrevista após a votação no Conselho de Segurança da ONU. Durante a entrevista ao 'FT', afirma a assessoria, Amorim teria dito ainda que "o Brasil está pronto a participar de um processo menos ambíguo" e que o país "continua a estimular o Irã a ser cooperativo com a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA)".
Esperança
Mas, apesar de afirmar que o Brasil não terá mais uma posição ativa no confronto, o chanceler brasileiro disse nesta segunda a jornalistas durante um evento em Viena que ainda acredita na adoção de um plano para que o Irã entregue parte do seu material nuclear.
"Na minha opinião, acho que as sanções tornaram [a negociação] mais difícil, em vez de mais fácil. Mas não acho que tornaram impossíveis", disse Amorim. "Então, se houver boa vontade e flexibilidade, ainda será possível encontrar um acordo", afirmou. "Ainda estamos esperançosos de que a declaração de Teerã possa ser usada como base para ... uma solução negociada e pacífica."
Amorim se disse perplexo com a resolução do Conselho, e confirmou que a indiferença das grandes potências ao acordo do urânio foi uma das razões que levaram ao "não" brasileiro.
Ele também criticou o momento da votação, apenas horas depois de o Ocidente rejeitar oficialmente a proposta mediada por Brasil e Turquia. "Não poderíamos ter votado de qualquer maneira diferente [do 'não']", declarou Amorim, acrescentando que autoridades ocidentais tiveram "belas palavras" para a mediação brasileira, mas que suas ações não acompanharam isso.
Por causa dessa experiência, segundo o chanceler, o Brasil está receoso em aceitar outros papéis de mediação. Os EUA inicialmente apoiaram a intervenção brasileira, mas apresentaram objeções inesperadas de última hora. "Não podemos proceder com base na ambiguidade. Precisamos de alguma solicitação inequívoca para nos envolvermos", afirmou.
* Com informações da Reuters