Publicada em 03/11/2008
Zean BravoRIO - Enquanto os olhos de ressaca de Capitu são comparados aos de uma "cigana oblíqua e dissimulada", os de Escobar são descritos na obra de Machado de Assis como ora sendo "olhos policiais a que não escapava nada", ora "dulcíssimos". Paradoxal? Uma das principais apostas do diretor Luiz Fernando Carvalho na série "Capitu", o desconhecido Pierre Baitelli buscou justamente esse olhar dúbio para o personagem que viverá na TV - afinal, Escobar teria traído ou não o melhor amigo com sua mulher, Capitu? A adaptação de cinco capítulos, que estréia dia 9 de dezembro na Globo, não se preocupa em dar respostas para a principal questão de "Dom Casmurro", um dos romances mais debatidos da literatura brasileira.
- O Luiz falava muito para trabalhar com o verso dos personagens, com o positivo e o negativo, com esta dubiedade - conta Pierre, que atuou o tempo todo norteado por essas palavras. - Escobar é descrito por um dos personagens como dono de olhos dulcíssimos e por outro como se tivesse olhos policiais. Construir isso não foi fácil. Eu não podia em nenhum momento entregar se ele era uma pessoa boa ou não - explica.
Em "Capitu", Carvalho faz questão de enfatizar o forte viés da dúvida. Com uma linguagem atemporal, a série, gravada em impressionantes cenários que reproduzem o século XIX no antigo Automóvel Clube do Brasil, no Centro do Rio, está dividida em duas fases e tem um elenco formado em sua maioria por rostos novos. A primeira parte da história mostra o caso de amor entre os jovens Bentinho e Capitu. Já na segunda, a dúvida atormenta Bento Santiago, que acredita ter sido traído por Capitu, com quem se casou, e o amigo Escobar.
Pierre viverá Escobar nas duas fases. Capitu será interpretada por Maria Fernanda Cândido (na fase adulta) e pela vocalista do grupo Manacá, Letícia Persiles (quando menina). Estreante na Globo, o ator, escritor e apresentador de TV Michel Melamed fará o Bentinho maduro e o casmurro narrador do drama que marcou a literatura brasileira. O ator César Cardadeiro ficou com o personagem adolescente.
O franzino Pierre, que precisou "pegar uns cinco quilos de massa magra", ganhou caracterizações distintas para marcar os dois momentos de seu personagem.
- Deixei crescer o bigode e uma barbicha para a segunda fase. Já na primeira, o meu cabelo estava enorme, encaracolado, meio anjinho - descreve o ator, de 24 anos, que já havia feito pequenas participações em novelas como "Pé na jaca", da Globo, e "Floribella", da Band.
Segunda série do projeto Quadrante - que traz adaptações literárias para a TV e começou em 2007 com uma homenagem a Ariano Suassuna - "Capitu" marca o ano do centenário da morte de Machado. Selecionado para o papel de Escobar através de testes, Pierre diz que saiu "completamente diferente" dos intensos ensaios de dois meses que precederam as gravações - uma marca registrada de Carvalho.
- Só aqueles dois meses de preparação já valeram - garante o ator, que passou por um cuidadoso trabalho de preparação corporal. - Minha experiência no teatro sempre foi para o lado corporal. Mesmo assim participei de wokshops voltados para dança nos ensaios. O livro diz que Escobar corta o espaço como uma lâmina e precisei trabalhar essa agilidade dele. Dancei um rock pesado durante uma hora e meia para gravar a cena em que o Escobar conhece o Bentinho.
O enredo de "Capitu" se desenvolve a partir da promessa de Dona Glória (Eliane Giardini), mãe de Bentinho. Depois de perder um filho, ela jura fazer do próximo herdeiro um padre. Mesmo a contragosto, Bentinho vai estudar em um seminário, onde conhece Escobar, rapaz inteligente e sedutor que se torna seu melhor amigo. Quando deixam o seminário, ele forma-se advogado e se casa com Capitu, sua paixão adolescente. Escobar torna-se comerciante e se casa com Sancha. Os casais mantêm fortes laços de amizade, mas Bentinho é atormentado pelo ciúme.
A fatalidade marca a vida de Escobar, que morre afogado. A morte do amigo aumenta ainda mais o tormento de Bentinho, que acredita ver no próprio filho, Ezequiel, a imagem do amigo. Este trabalho representa um salto na carreira do petropolitano Pierre, que começou a fazer teatro aos 8 anos depois de assistir a uma peça no colégio.
- Foi a única coisa que eu quis fazer na vida - garante o ator, que trocou sua cidade natal pelo Rio, aos 15 anos. - Estudei na CAL (Casa das Artes de Laranjeiras), fiz curso no Laura Alvim e me formei na faculdade de Artes Cênicas - lista Pierre.
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